Alongue o pavio!
Nos filmes. É comum o clichê: num acesso de raiva, o protagonista atira um copo no espelho. Ou arrebenta o pára-brisa do carro do desafeto com o que aparecer na frente, tipo taco de beisebol ou extintor de incêndio. Chato é que essas cenas são mais reais (e comuns) do que se imagina. Não o ato específico de lançar copo e esmigalhar o vidro. Estamos falando que hoje é cada vez mais normal explodir por bobagem. Uma pesquisa recente, realizada com mil executivos, mostrou que 52% deles reagem com agressividade quando são contrariados. O prior é que pouca gente desconfia que o destempero pode ser mortal. Segundo o Instituto Nacional de Cardiologia (INC), homens que se irritam com facilidade tornam-se vítimas potenciais de angina, arritmias e até de morte súbita. Isso mesmo, a raiva pode matar você!
Brigas em baladas, discussões no trânsito, irritações no aeroporto ou na fila do supermercado estão por um fio de acontecer o tempo todo. Você costuma ser o astro principal desses espetáculos públicos deprimentes? Sua família ou seus colegas já estão acostumados com seus showzinhos? Tudo bem, todo mundo experimenta momentos de ira, mas se você pretende viver muitos anos tem de aprender a se controlar. “É preciso tanto não cultivar a raiva quanto não deixar que ela nos domine quando ataca”, explica a psicóloga Ana Maria Rossi, presidente do braço brasileiro da International Stress Management Association (Isma-Br) e autora do livro Estresse Masculino (Ed. Artes e Ofícios, 160 págs.).
Quem leva a vida de forma tensa tem um risco três vezes maior de sofrer um AVC (acidente vascular cerebral, vulgo derrame) e seis vezes maior de ataque cardíaco. Muita gente não desconfia, mas explosões freqüentes caracterizam uma doença crônica como transtorno explosivo intermitente (TEI). É uma disfunção do funcionamento do sistema nervoso central que atinge a área do cérebro que regula a impulsividade. Vítimas da síndrome perdem o controle e reagem com agressividade – ofendendo, gritando, socando a parede – de forma desproporcional.
O problema é que o TEI é uma doença ainda pouco conhecida no mundo tido, já que o portador é costumeiramente considerado apenas um “cara nervosinho”. “A falta de percepção da gravidade da raiva crônica dificulta o diagnostico e o tratamento da doença”, afirma o psicoterapeuta Mike Fischer, fundador da Associação Britânica de Gerenciamento da Raiva.
O TEI fica caracterizado se o sujeito explode mais de duas vezes por semana, e a situação se prolonga por alguns meses. Na maioria dos casos o paciente não se dá conta de que é portador do transtorno (como se pode notar nos dois personagens principais do filme Tiros em Columbine, do diretor americano Michael Moore). A gente torce que esse não seja o seu caso.
Como a última coisa que queremos é que você não morra de raiva, conheça como agir em situações capazes de provocar erupções de seu vulcão interno e comprometer sua saúde e seus relacionamentos.
BOMBA O CHEFE QUE APRRINHA VOCÊ
Um estudo do Isma-Br, realizado em 2005, analisou mil executivos com idade entre 25 a 60 anos. Identificou-se que 47% eram agressivos e explodiam por qualquer coisa. Deles, 83% guardavam muita raiva, o que desencadeava reações fisiológicas como taquicardia, hipertensão, cansaço terrível e fortes dores nos músculos e na cabeça. Dois anos depois, a pesquisa foi refeita e o número de agressivos subiu para 52%.
DESARME Naqueles dias em que seu chefe desertou em você o temperamento do Hulk (obviamente você não cresceu e não ficou na cor verde na frente dele), antes de ir para casa deixe na gaveta todo o rancor. À noite, fuja dos noticiários de TV e programas mundo-cão que vão deixá-lo revoltado e reaviver os sentimentos ruins do dia. Estudo da Universidade de Utha (EUA) apontou que os homens são mais sujeitos a se aborrecer com as notícias ruins do jornal do que as mulheres. E, se o embate com o chefe insistir em ficar atormentando seus pensamentos, experimente imaginar sua mente como uma lousa sendo apagada.
Viver irado aumenta seis vezes o risco de ataque cardíaco.
BOMBA SUA EX QUER INFERNIZAR VOCÊ
Os relacionamentos afetivos são terreno fértil para a raiva, que pode acabar matando você. Casais separados cultivam sentimentos negativos que se instalam internamente e se tornam gatilhos para as explosões de fúria. “alimentar a negatividade com as lembranças é fazer questão de viver mal”, afirma Ana Maria Rossi. “Quem sai perdendo com a ruptura quer fazer o ex-parceiro sentir culpa, mas o outro normalmente não está nem aí. Daí a raiva vira crônica.”
DESARME Não permita que ressentimentos do passado contaminem seu futuro. Releve as provocações, administre com calma as quedas de braço, que fatalmente surgem a respeito de filhos, bens e pensões. “Importante, pratique o desapego: viva sua vida, concentre-se em sair feliz de uma nova parceira e permita que sua e também reconstrua a vida dela”, frisa a psicóloga. Nas horas de cabeça quente, cuidado ao dar ouvidos a seus amigos. Parceiros que são, eles podem justificar seus erros e incitá-lo a se atirar de cabeça de guerra.
Alimentar mágoas envenena seu corpo.
BOMBA O SEXO NÃO ANDA LÁ ESSAS COISAS
Se você vive com emoções à flor da pele, dificilmente sua performance na cama vai ser parecida com aqueles caras dos filmes dos canais adultos. As relações sexuais vão terminar em insatisfação ou frustração (para, você, para ela ou para os dois) e o resultado será... raiva. De você mesmo ou dela. Um homem emocionalmente abalado corre o risco de acabar com diminuição do desejo sexual, ejaculação precoce e, em casos extremos, pode até parar de açular. Por quê? O desempenho depende do equilíbrio entre os sistemas nervosos simpático (responsável pela excitação e pela ejaculação) e parassimpático (que regula a vasodilatação do pênis). “nuca cara estressado, um desses sistemas vai predominar desregulando o sistema”, avia o psiquiatra Carlos Eduardo Carrion, consultor da Men´s Health.
DESARME Não existe fórmula mágica para sair desse turbilhão: cada um tem que descobrir como relaxar e encontrar satisfação. “Pense se não está levando para a cama ressentimentos e preocupações”, diz o especialista. Se não adiantar não deixe a raiva dominar você. Procure em urologista ou um psiquiatra: ele pode receitar um medicamento para aliviar seu estresse.
BOMBA FECHADA NO TRÂNSITO
Agressividade e desrespeito às leis de trânsito: uma dobradinha explosiva. Segundo pesquisa de 2007 do antropólogo Roberto DaMatta, professor da PUC do Rio de Janeiro, as ruas se tornaram campos de batalha para os motoristas capixabas – o estudo foi feito lá, mas a postura insana não é exclusividade do Espírito Santo. A maioria dos 300 homens ouvidos acham que os mais espertos levam vantagem no trânsito: por isso quando podem desrespeitam as normas. Na verdade, o acúmulo de tensão sobre rodas é mortífero: eleva os níveis de cortisol e adrenalina, hormônios que em excesso na corrente sanguínea detonam os sistemas gastrointestinal, cardíaco e imunológicos.
DESARME “Curtir uma música legal e ter uma garrafa de água a bordo ajuda a relevar as barbeiragens, diz a psicóloga Isolania Proença. Outra forma de relaxar ao volante é inspirar profundamente, segurar o par por cinco segundos e expirar.
BOMBA CELULAR FORA DO SERVIÇO
Ah, você dá porrada no mouse, xinga o controle remoto e é um péssimo perdedor no Playstation? Prepare-se para bater o cartão no cardiologista. Descarrega a ira em objetos inanimados não traz nenhum alívio, porque a briga é com você mesmo. Pior ainda é estourar com as pessoas à sua volta – geralmente pais, irmãos ou pessoas que são – “obrigadas” a agüentar você, pois provavelmente seu chefe não iria aturar seus escândalos.
DESARME Estudo da Universidade do Arkansas, nos EUA, mostrou que o descarrego traz bem-estar momentâneo, mas no momento seguinte você fica superdeprimido, com uma bela ressaca moral. “Às vezes, irritação com pequenas contrariedades mascara problemas maiores que a pessoa pode estar empurrando para baixo do tapete”. Diz Ana Maria Rossi. Faça uma auto-avaliação. Se não for o caso, enfrente as situações com humor. O celular não pega? Compre um cartão e ligue do telefone público.
BOMBA AMIGOS QUE DEIXAM VOCÊ NA MÃO
A raiva também costuma ser uma emoção secundária que os homens experimentam quando se sentem solitários ou rejeitados. Sabe aquele amigo que nunca tem tempo para ir ao cinema ou ao bar com você? A frustração vem do excesso de expectativa que você coloca em seus relacionamentos e que deixa você infeliz, irritado.
DESARME A psicóloga Ana Maria Rossi recomenda um exercício para você avaliar as verdadeiras amizades – gastar energia com quem não vale à pena pode alimentar maus sentimentos dentro de você.
Primeira fase: num papel, liste pessoas com que você gostaria de bater papo ou ir ao estádio.
Segunda fase: você conhece várias pessoas legais, mas muitas não moram na sua cidade, certo? Circule apenas os nomes de quem você poderia encontrar hoje ou amanhã.
Terceira fase: coloque uma estrela ao lado das pessoas com quem você realmente pode contar em todos os momentos. “Talvez você não seja uma constelação, mas fará você dar mais valor a quem merece”, diz Ana Maria. “Isso ajudará você a refletir se em algum momento as pessoas excluídas não foram maltratadas por você. Se for a sua vontade, aproveite para investir em novas amizades e leve o aprendizado para os próximos relacionamentos.
BOMBA O MUNDO NÃO DÁ O QUE VOCÊ MERECE
É fato: a maioria de nós não sabe lidar com as frustrações – verdadeiras sementes de comportamentos agressivos. Alguns, movidos pelo desejo de ganhar muita grana e alcançar posições de destaque na profissão, chegam a aceitar pagar o preço de renunciar à família, aos amigos e à satisfação pessoal. Decepcionados em suas ambições, descontam a frustração por meio de explosões de raiva que atingem quem geralmente não tem nada a ver com o peixe. É o se caso?
DESARME “Canalize seus desejos em algo palpável e o resto virá”, recomenda a psicóloga Isolina Proença. A cada desejo não satisfeito, pergunte a si mesmo se o copo d´água está meio cheio ou se está meio vazio. Copo meio vazio: talvez você nunca a ter uma Ferrari. Copo de cheio: seu possante é econômico, confortável e leva você a todo lugar. Então para que tanta raiva?
DESESTRESSE E LIBERTE O CARA LEGAL DE DENTRO DE VOCÊ.
MANUAL DO ESQUADRÃO ANTIBOMBA
1 – Vá devagar – o simples fato de respirar acalma sua freqüência cardíaca, domina sua resposta raivosa e evita que você dê patadas, “Note como a respiração entra e sai, e focalize em uma atitude substituta, como a compaixão”, ensina Deborah Rozman, psicóloga americana, autora de Transforming Anger (Transformando a Raiva).
2 – Ponha para fora no esporte – Raiva é energia. Então a libere fazendo algo físico, aconselha o psicólogo americano William Pollock, autor de Read Boys (Garotos de Verdade). Os exercícios têm a vantagem adicional de aumentar a autoestima. Quanto mais em forma e saudável você estiver, maior será sua capacidade de lidar com bombas estressantes.
3 – Cuide do seu umbigo – Um jeito de controlar a raiva é começar a se responsabilizar pelos seus atos. “Tendemos a achar que os outros são os culpados dos nossos infortúnios, mas na maior parte das vezes eles são reflexo de nossos próprios comportamentos” frisa a psicóloga Isolina Proença.
4 – Xingue um bloco – “anote seus pensamentos raivosos num caderno”, diz o psiquiatra Redford Willians, autor de Anger Kills (A Raiva Mata). Lendo depois, você identifica padrões de comportamento e a origem de tanto rancor.
5 – Controle a mente – Pense em uma situação irritante e, em vez de imaginar com manifestaria a insatisfação, concentre-se em ficar calmo, aconselha a psicóloga Ana Maria Rossi. Com treino, a postura pacífica se tornará reflexo em situações reais.
Ipsis litteris da Matéria escrita por Bruno Favoretto e Dan Rookwood
Fonte: Men´s Health. Editora Abril. São Paulo, n.33, p. 48-52-, jan. 2009.